Diego Hypolito, 32, falou abertamente, pela primeira vez, sobre sua orientação sexual. Em longo e emocionante texto publicado no UOL Esporte, o ginasta contou se descobriu gay aos 19 anos de idade e que se escondeu por medo de afetar sua carreira.
“Eu vivi a solidão de não ter ninguém com quem eu pudesse compartilhar os dilemas de ser uma pessoa gay numa sociedade preconceituosa. Por mais que todo mundo tenha a impressão de que tem muito gay na ginástica, não tem. Todo mundo me zoava, zombava do meu jeito. Eu tinha o sonho de conseguir uma medalha olímpica e faria de tudo para chegar lá, até esconder quem eu era. Eu tinha certeza que se um dia eu saísse do armário publicamente, perderia patrocínios e minha carreira seria prejudicada”, escreveu ele.
“A minha felicidade era a ginástica, então se eu não pudesse ser completo na minha vida pessoal, nem tinha tanto problema. Eu ia continuar a esconder a minha sexualidade para manter vivas as minhas aspirações no esporte. E deu certo, né? Uma medalha de prata em Olimpíada. Dois títulos e outras três medalhas em Mundiais. Mais 69 em Copas do Mundo”, continuou.
“Eu caí duas vezes em duas Olimpíadas, uma vez de cara, outra de bunda no chão, e enfrentei uma síndrome do pânico antes de conseguir a prata na Rio-2016 – contrariando as expectativas de todo mundo, menos as minhas. Realizei meu sonho e virei exemplo de superação para muita gente. Tenho muito orgulho do que fiz. Mas odeio mentir”, contou ele. Sobre ter sua sexualidade questionada por muitos anos, Hypolito revelou que pediu ao assessor de imprensa para que evitasse esse tipo de pergunta.
Hypolito falou sobre assumir publicamente sua homossexualidade. “Eu tinha muitos preconceitos comigo mesmo. Medo relacionado aos patrocínios, à Seleção Brasileira, de eu deixar de ser um exemplos pelos meus resultados”, contou ele. “O que motivou foi mostrar que a questão de sexualidade não faz a pessoa ser melhor ou pior. Somos pessoas e o que eu sei é que eu nasci assim. Isso não muda minhas crenças, em ter meus princípios morais, de educação. Existe um ódio muito grande implantado nas pessoas em todos os tipos de etnias, religiões, sexualidades. Eu ser eu mesmo diariamente é algo que vai me fazer ser mais liberto”.
Religioso, Hypolito também revelou no texto que achava que “ser gay era ser um demônio”. “Quando passei a entender melhor a minha sexualidade, meu maior problema sempre foi como iria contar para a minha família. As pessoas não sabem, mas a gente tinha uma origem humilde, do interior e religiosa. Eles nunca entenderiam. A gente passava por tanta dificuldade em casa… nem sempre tinha o que comer, chegamos a ficar meses sem energia elétrica. Como é que eu ia levar mais um problema para eles? Eles tinham abdicado da vida deles em São Paulo para ir comigo e com a minha irmã Daniele para o Rio. Ia falar sobre sentimentos e coisas pelas quais eu passava sendo que eles tinham tantas preocupações mais sérias?”.
O ginasta também contou que as críticas o afetaram profundamente. “As pessoas diziam tanto que eu era feio que eu passei a acreditar. O pessoal da ginástica começou a me chamar de Frankenstein, e realmente passei a achar que eu era um monstro. Até que eu comecei a namorar um cara que eu achava ser muito mais bonito que eu. Eu tentei de inúmeras maneiras compensar esse desequilíbrio, até aplique no cabelo eu usava para esconder a calvície precoce. Por vários motivos, esse foi um relacionamento abusivo. Até que ele ameaçou terminar o namoro se eu não revelasse que era gay para a minha família”.
FAMÍLIA
Em 2014, Diego reuniu coragem para se assumir para a família. Irmão da também ginasta Daniele Hypolito, esreveu uma mensagem para a mãe, que não reagiu muito bem no primeiro momento. “Sendo eu o filho mais próximo, deve ter sido muito difícil para ela também. Eu estava com muita vergonha de encarar a minha família. Eu me afastei deles por quase um ano, cheguei a perder um Natal por causa desse clima ruim. Meu pai reagiu melhor e a Daniele me apoiou incondicionalmente, disse que sempre soube mesmo sem eu nunca ter falado nada”.
“Foram anos e muita terapia, além da proximidade com outras pessoas gays, para que eu chegasse nesse ponto de ter a coragem de falar abertamente sobre a minha sexualidade. Acho que meu exemplo pode fazer com que muitos garotos que hoje estão sofrendo deixem de sofrer. Muitos não se aceitam como são ou não são aceitos pela família e têm pensamentos suicidas por não conseguirem corresponder às expectativas dos outros. Quero que as pessoas saibam que eu sou gay e que eu não tenho vergonha disso. E não é porque eu sou que outras pessoas vão querer ser. Isso não tem nada a ver. Já vivi muitos anos pensando no julgamento que os outros fariam sobre mim. Hoje só aceito ser julgado por Deus”, acrescentou o ginasta.
“Sei que pode ter gente que vai deixar de gostar de mim depois de conhecer a minha história, sei que no culto posso viver situações de preconceito, sei que vir a público e falar tudo isso pode irritar algumas pessoas. Ninguém é obrigado a entender nada, mas é obrigado a respeitar. Nunca mais vou deixar de viver o que eu sou. Eu sou gay”, finalizou Hypolito.
*Revista Quem