Os impactos da construção de hidrelétricas na Amazônia Legal

Protesto de mulheres Munduruku na Usina de São Manoel Foto: Juliana Rosa Pesqueira
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A energia elétrica utilizada em casa para finalidades básicas, como manter uma água gelada ou um ambiente artificialmente iluminado e ventilado, resulta de recursos naturais. Hoje, sendo um dos tipos de energia mais usados, pode ser obtida por meio de usinas termelétricas, eólicas, termonucleares e hidrelétricas.

Levando em conta a quantidade existente de rios e o grande volume de água, a principal fonte de energia elétrica do Brasil é a usina hidrelétrica. Adorea Rebello, professora do Departamento de Geografia da UFAM e doutora em Planejamento Ambiental, afirma que atualmente 64% da energia elétrica do país vem das hidrelétricas.

“Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”, uma frase muito dita em aulas de Ciências e que explica o processo de transformação da energia das águas em energia elétrica: “A estrutura de uma hidrelétrica consiste em construir barragens através do processo de inundação. Precisam ser construídas em um relevo acidentado, ou seja, com desníveis. Assim, pode ter corredeiras e cachoeiras, o que gerará velocidade nas águas para levar energia para as turbinas”, afirma ela.

 

Bacias hidrográficas e barragens na Região Amazônica

As bacias hidrográficas amazônicas chamam a atenção pelo intenso volume de água que passa pela região e também pelas quedas topográficas significativas nos afluentes. Por esses motivos, só na Amazônia Legal há cerca de 158 barragens. Vale destacar que estas barragens estão concentradas no Arco do Desmatamento, uma faixa onde lavouras e pastagens tomaram o espaço da floresta.

As maiores hidrelétricas da região são a de Tucuruí, no Rio Tocantins (PA); a de Balbina, no Rio Uatumã (AM); a de Samuel, no Rio Jamari (RO); a de Santo Antônio, no Rio Madeira (RO) e a de Jirau, também no Rio Madeira (RO).

Além das existentes, também há pelo menos 351 novos projetos de hidrelétricas na bacia do Rio Amazonas apontadas como mais prejudiciais que a de Balbina, por exemplo.

A produção de gases e os riscos à saúde

No início, as hidrelétricas surgiram como uma fonte de energia limpa e de baixo custo. No entanto, um estudo de 2002 feito pela Coppe/UFRJ (Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia da Universidade Feral do Rio de Janeiro) já afirmavam que uma hidrelétrica pode produzir mais gases nocivos à atmosfera do que uma termelétrica, usina que utiliza a queima de combustíveis para gerar energia.

A ausência de oxigênio e a grande quantidade de matéria orgânica do fundo do lago das hidrelétricas provocam grande produção de gases que prejudicam o meio ambiente.
“As usinas hidrelétricas de qualquer forma poluem muito. Elas emitem muito gás carbônico (CO2) para atmosfera e onde elas inundam, se torna um ambiente com bastante madeira em decomposição, o que causa um odor insuportável e destrói a fauna e a flora. É uma poluição tanto visual, como olfativa”, informa a geógrafa Adorea.

Há também a emissão de óxido nitroso (N2O), pelas superfícies das represas e metano (CH4), uma grande contribuição para o aquecimento global.
Uma ameaça para as espécies

Um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São João Del Rey (MG), analisou recentemente todas as notificações de cardumes mortos por implantação de usinas hidrelétricas nos últimos dez anos no Brasil. Ao todo, foram 128 mil quilos de peixes mortos encontrados em praticamente todas as bacias hidrográficas existentes no país.
​Em poucos segundos, os peixes são sugados por dutos e são levados para as turbinas das usinas. Em seguida, são arremessados para o outro lado das barragens, o que afeta seu organismo. Muitos peixes não morrem nesse momento, mas podem chegar a romper alguns órgãos.

Barragens e povos próximos

​Segundo dados cedidos por Philip Fearnside, ecologista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e ganhador do Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC) em 2007, tanto as barragens existentes, quanto as planejadas, resultam em consequências diretas na vida dos povos que ali habitam.

Ele destaca os impactos das grandes hidrelétricas da região, construídas próximo a terras indígenas: a hidrelétrica de Tucuruí, que inundou parte da terra indígena dos Parakanã; a hidrelétrica de Balbina, que inundou as duas maiores comunidades dos Waimiri-Atroari; as hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, que não inundaram terras indígenas, mas provocaram uma diminuição grande na pesca em todo o rio Madeira e seus afluentes e a hidrelétrica de São Manoel, que resultou em implicações marcantes na Terra Indígena Kayabi, localizada a apenas 700 metros da barragem.
Os impactos negativos sempre serão maiores que os positivos, porém há o desenvolvimento de atividades turísticas como alternativa de renda em alguns casos de reservatórios, pontua Adorea.

“O maior risco é essa população ser atingida por um rompimento de uma barragem, pelo processo de inundação. O controle da não-aproximação é quase impossível porque quando a espacialidade local é reconfigurada, há a atração de pessoas. São pessoas que querem trabalhar com cultivo, plantação e turismo. Existe esse risco da força da pressão da água romper e levar tudo por água abaixo, entretanto, se você for até o lago da hidrelétrica de Balbina, que eu conheço, você vai ver pessoas desenvolvendo o seu sustento através do lazer, por exemplo. Os comunitários desenvolvem a pesca esportiva do tucunaré, passeios aquáticos, hospedagem, então existe esse lado que gera renda também”.
É importante citar que a construção da Usina Hidrelétrica de Balbina, nos anos 80, surgiu para reduzir a dependência da cidade de Manaus de usinas que utilizam combustíveis fósseis. No entanto, a construção inundou uma área florestal que equivale a 2,4 mil quilômetros para produzir menos de 10% da demanda da capital.

 

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