Um artigo publicado recentemente na revista Science aponta que as florestas da Amazônia escondem milhares de registros de antigas comunidades indígenas. O estudo foi assinado por uma equipe de 230 cientistas de 156 instituições localizadas em 24 países de 4 continentes, entre eles estão 33 pesquisadores, entre alunos e doutores, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI). A pesquisa foi liderada pelos cientistas Vinicius Peripato e Luiz Aragão do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe/MCTI).
O estudo utiliza tecnologia de ponta em monitoramento remoto aliado a dados arqueológicos e modelagem estatística avançada para quantificar quantas “obras de terra” ainda podem estar escondidas debaixo do dossel da floresta amazônica (a cobertura superior da floresta formada pelas copas das árvores) e em quais locais é mais provável encontrar estas estruturas. Estas “obras de terra” podem ser escavações ou o acúmulo de terra formando elevações.
Por meio de uma tecnologia avançada de mapeamento remoto, utilizando um laser embarcado em avião, conhecido como LiDAR (Light Detection and Ranging) os cientistas identificaram 24 novos registros arqueológicos e por meio da modelagem, estimam que a Amazônia pode abrigar mais de 10.000 registros de obras pré-colombianas (construídas antes da chegada dos europeus).
O sensor permite reconstruir os elementos da superfície em um modelo 3D. A partir dos modelos 3D da superfície é possível remover digitalmente toda a vegetação e iniciar uma investigação precisa e detalhada do terreno sob a floresta. A equipe utilizou várias bases de dados LiDAR que foram inicialmente obtidas para estimativas de biomassa. Em cima dessas informações a equipe investigou um total de 0,08% da Amazônia e encontraram 24 estruturas, jamais catalogadas, nos estados brasileiros de Mato Grosso, Acre, Amapá, Amazonas e Pará.
Usando todos os registros de obras terrestres encontrados até agora (961), a equipe também quantificou quantas estruturas ainda podem ser encontradas e demonstrou que dezenas de espécies de árvores estão relacionadas com essas ocupações antigas que remontam de 1.500 a 500 anos atrás. Essas estruturas são conhecidas como “obras de terra”, e são anteriores à chegada dos europeus no continente.
As estruturas encontradas recentemente, debaixo da floresta intacta, são muito parecidas com o geoglifos (grande figura feita no chão, geralmente com mais de quatro metros de extensão, em morros ou regiões planas), que foram descobertos anos atrás quando a floresta foi cortada para agricultura no Acre. Estas, também estão, normalmente, associadas a outros tipos de modificações da paisagem, que comprovam a presença de ocupações indígenas em várias regiões da Amazônia como as terras pretas de índio e a presença de espécies domesticadas, entre outras evidências.
Hans ter Steege, do Naturalis Biodiversity Center e da Universidade de Utrecht, sugere que cerca de 90% da Amazônia permaneceu praticamente intocada, com uma baixa probabilidade de ter sido alterada pelo homem. No entanto, Carolina Levis, egressa do Inpa, destaca que a pesquisa moderna, combinando várias evidências pré-colombianas, revela que muitos locais da floresta já foram locais de obras de engenharia dos povos daquela época.
“Tempos atrás, os ecólogos viam a Amazônia como a grande floresta intocada, mas agora, combinando outros tipos de vestígios pré-colombianos, podemos perceber como muitos locais que hoje sustentam uma densa floresta já foram submetidos à extensas obras de engenharia e ao cultivo e domesticação de plantas pelas sociedades pré-colombianas. Esses povos dominavam técnicas sofisticadas de manejo da terra e das plantas, em certos casos, ainda presentes nos conhecimentos e práticas dos povos atuais que podem inspirar novas formas de conviver com a floresta sem a necessidade de destruí-la”, pontua.
Até agora, essas obras de terra eram comumente encontradas por meio de imagens do Google Earth, no entanto, devido à extensão da floresta amazônica e às dificuldades de estudar áreas remotas, o estudo lança previsões testáveis sobre locais pouco conhecidos da Amazônia, onde novos trabalhos de campo, provavelmente, no futuro, descobrirão sítios arqueológicos de dimensões monumentais e ainda bem preservados dentro da floresta.
Este estudo inédito ainda tem implicações políticas sobre o debate atual sobre o marco temporal de terras indígenas no Brasil. “Em tempos de discussões sobre marcos regulatórios de propriedade e direito às terras indígenas, esta pesquisa traz inúmeras evidências da ocupação ancestral da floresta amazônica por povos originários, de suas formas de vida e da relação estabelecida por eles com a floresta”, afirmam os autores. “A proteção de seus territórios, línguas, culturas e heranças deve ser compreendida como milenar, como são, e não ligada a uma data, que é tão recente”.
Confira os cientistas do Inpa que participaram do estudo
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Adriano Costa Quaresma 37,
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Bruno Barçante Ladvocat Cintra 75,
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Charles Eugene Zartman 35,
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Cid Ferreira 35,
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Daniel P. P. de Aguiar 95
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Diógenes de Andrade Lima Filho 35,
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Edelcilio Marques Barbosa 35,
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Fernanda Coelho de Souza 18,17,
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Flávia R. C. Costa 18,
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Florian Wittmann 37,
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Francisca Dionízia de Almeida Matos 35,
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Guilherme Lobo 37,
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Henrique Eduardo Mendonça Nascimento 35,
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Hernán Castellanos 67,
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Iêda Leão Amaral 35,
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Ires Paula de Andrade Miranda 35,
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Jochen Schöngart 37,
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José Ferreira Ramos 35,
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Juan Carlos Montero 35,
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Juan David Cardenas Revilla 35,
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Layon O. Demarchi 37,
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Lionel Hernandez 67,
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Lorena M. Rincón 35,
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Luiz Carlos de Matos Bonates 35,
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Luiz de Souza Coelho 35,
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Marcelo Petratti Pansonato 35,
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Maria Pires Martins 35,
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Maira Rocha 37,
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Maria Teresa Fernandez Piedade 37,
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Mariana Victória Irume 35,
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Rogério Gribel 35,
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Timothy J. Killeen 61,
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William E. Magnusson 18,